PANDEMIA E PANDEMÔNIO.

Talvez todos já estejamos mortos. Só falta criar as condições para permitir o enterro.


Continuamos recebendo notícias de mortes pelo coronavírus. Os números deixaram de representar quantas pessoas partiram. São apenas estatísticas. Eu não consigo imaginar 500 mil mortos. Passa a ser algo que não cabe na minha cabeça; seja pela estupidez de tantas mortes, seja pela magnitude desse número.

Porém há um outro detalhe. Tampouco cada morte nos emociona. Já superamos esse momento de ficar transtornados com o passamento de alguém, conhecido ou não. Por uns microssegundos olhamos para a foto dele ou dela no celular e passamos para a postagem seguinte.

Lembro que na minha infância o comércio baixava as portas para passar a procissão com o féretro, a caminho do cemitério. Quando essas procissões foram suprimidas, ainda comentávamos a fatalidade com os parentes, com os amigos. Agora não mais. Nos aproximamos do costume indígena de não mencionar a pessoa após ela partir deste mundo. Mas não é igual. Eles o fazem por dor, pelo sentimento de perda, pela saudade. Nós o estamos fazendo por insensibilidade.

A única explicação que encontro para esse descaso com a morte dos outros é a suposição de que talvez todos já estamos mortos. Só falta criar as condições para permitir o enterro. Carece transformar esses cadáveres quentes e ambulantes em uma massa de carne e de ossos gelados e estáticos para poder acomodar nos caixões e enfiar na terra. O corpo, porque os corações, esses já foram.

Acesse outro post com essa temática.

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