Vivenciar o adeus aos amigos em um velório, pode nos levar a perguntar que tipo de adeus estamos dando.
O VELÓRIO DO DITIAN.
Durante o mês de novembro a coluna O Cotidiano apresenta uma série de narrativas sobre a finitude humana. Acompanhe!
O avô de um amigo faleceu e os ritos foram no templo budista frequentado pelo ditian.
Sou avesso a esses eventos. Aliás acho que ninguém gosta. Eu não tenho vocação para carpideira de velórios. Bom, mas sempre é aconselhável ir a um velório caminhando. Melhor do que carregado. Certeza.
Mas nesse dia, fiquei curioso, pois nunca havia participado de uma cerimônia no templo budista. O clima de respeito chamava atenção. Nada das piadas e das risadas dos velórios da minha vizinhança. Muita polidez no trato entre todos, que se cumprimentavam respeitosamente.
Um dos amigos do finado foi até o caixão, com uma folha de papel. Fez um discurso, que acabou emocionado, em japonês. Logo, não posso contar o conteúdo. Depois dobrou o papel, que parecia inútil na sua mão e o depositou no ataúde, ao lado do amigo que partia.
Umas senhoras, bem idosas, postadas ao lado de uma pequena mesa, fizeram tinir os pequenos sinos que havia diante delas, com pancadas precisas. Uma de cada vez, pausadamente. Como não entendia nada do falado, estava tentando entender o sentido dos sinos.
Acabei percebendo que aqueles toques dos sinos impunham um silêncio profundo. De fato, todos permaneciam não só calados, mas cabisbaixos, compenetrados, em silêncio. Um silêncio que brotava de dentro de cada um e se materializava à nossa frente. Quase era possível pegá-lo com as mãos, vê-lo.
Claro, a família, os amigos, cada um de nós, ninguém pode entender a morte. Pareceu-me que era isso que os sinos diziam. Que já que não conseguimos entender a morte, melhor obedecer ao silêncio que os sons evocam, quase que ordenam. Um sino sendo tocado espaçadamente, além de chamar para o luto, para a sobriedade da cerimônia, também sugerem que existe um fluir natural que nos leva até a morte, mas que continua depois dela. Com isso ressignificamos a morte.
Deixa de ser um momento de fim, para ser um momento de travessia, de transformação. Por isso fica o corpo, dispensado, já não tendo serventia.
Ao mesmo tempo que toda essa visão cristã passava pela minha cabeça, tive que lembrar que no budismo há uma interpretação um pouco diferente, mas o silêncio reinante não ajudava em nada lembrar-me dessa visão e comparar com o que estava tão presente na minha cabeça.
Sem saber o que dizer, lá nos meu íntimos, soltei um pensamento, vá com Deus ditian, seja Ele o Deus que for.
Áudio: trabalhos técnicos de Élson Ferreira da Silva – UEL FM.