O ser humano, através da civilização, vem buscando diferenciar-se dos animais. Alguma coisa ainda resta.
A última coisa que queremos é nos identificar com nossa natureza bruta, nosso lado animal. O que chamamos de civilização, veio ao longo do tempo nos diferenciando dos bichos. Contudo, em três aspectos não conseguimos fugir desta ligação com eles. Quando nos alimentamos, quando realizamos as tais necessidades fisiológicas e nossa reprodução, ainda guardam as referências do mundo animal. Nestes itens, não nos diferenciamos muito deles. O que viemos fazendo ao longo dos milênios? Passamos a comer em grupos, como os grandes felinos, mas sentados ao redor de uma mesa, utilizando talheres e um arsenal de regras de etiqueta que vai ficando mais complexo quanto mais “civilizados” são os comensais, quanto mais caro o jantar. E assim, nos diferenciamos, deixamos mais longínquo nosso parentesco animal.
A reprodução, que nem sempre tem essa finalidade, nem denominação fácil tem. Fazer sexo, fazer amor, transar, molhar o biscoito. Não existe um termo claro e preciso para o ato. Vamos disfarçando a nomenclatura e realizamos o ato trancados, escondidos. Nem falar disso em público é algo confortável. É como se ninguém fizesse e de uma hora para outra surgissem os rebentos, trazidos pelas cegonhas.
As necessidades fisiológicas, nos trancamos no sanitário, ninguém vê, também. Quando os meninos disparam um pum, um arroto, os pais enlouquecem e repreendem. “Coisa feia!”.
Trancamos a porta do sanitário, mas não fica tudo resolvido. Mesmo a sós precisamos disfarçar. Aí levamos o celular. Quer uma coisa mais significativa da civilização, da cultura, do desenvolvimento, do que um aparelho eletrônico desses? Já viu alguém ir ao sanitário sem o celular? Então aproveitamos e atualizamos as mensagens das mídias sociais, assistimos uma palhaçada qualquer ou lemos uma notícia. Os glúteos na privada, mas a cabeça conectada com o mundo. É a sensação de que estamos em outro lugar, outra dimensão. Não somos bichos.
Findo o ocultado evento, aliviados, é hora de lavar o corpo animal que nos acompanha. Mas daí cantamos no chuveiro. Epa, não esquece de dar a descarga.