O PINTOR DE SORRISOS.

Pintura de Edson Camargo, Boituva, SP.

Escadas, tenho um certo fascínio por elas. Ao encontrar uma, ali apoiada em algo ainda mais alto, revivo o conto do Pirandello, o Acendedor de Lampiões. Pura poesia. Este antigo profissional, que competia com a lua no iluminar as noites, enche minhas pupilas. Outro profissional está, sempre ligado às escadas, o bombeiro. Quando todos correm do fogo, ele escala sua escada rumo ao perigo. Porém resta ainda uma associação com as escadas, entre minhas orelhas.

Quando os acendedores de lampião estavam perdendo seus trabalhos para a tecnologia da eletricidade, um outro profissional ganhava espaço. Um inconformado que olhando o cinza, o descolorido das cidades, chegou à conclusão de que seria necessário colorir a vida. Escada ao ombro, uma lata de tintas à mão, passou a incendiar de cores toda a cidade, munido de um pincel. As paredes iluminaram-se, a vida brilhou. Durante o dia, a luz solar conferindo encanto. À noite, a eletricidade substitui o sol, ao mesmo tempo que vai apagando as estrelas e o luar. O pintor de paredes dá sua contribuição para o embelezamento da criação. Porém, ao mesmo tempo que o pintor de paredes abrilhanta as nossas ruas, a cidade o mantém na escuridão, no anonimato. Invisível, talvez.

Pintura de Edson Camargo, Boituva, SP.

Isso pode ser verdade. Mas não é toda a verdade. Existe pelo menos uma voz dissonante nessa canção. O Camargo, pintor de paredes por profissão. Artista plástico por inconformismo. Não aceita pintar só paredes. Descobriu que com sua arte, pode pintar sorrisos. Aliás, quando lhe perguntei o que estava fazendo com sua arte, foi taxativo, “quero deixar as pessoas felizes”. Foi modesto. Quer deixar a cidade feliz com a pintura das paredes e as pessoas com seus quadros e esculturas.

Camargo também é um apaixonado. Por sua família, pelas pessoas, pela cidade, mas também pelo famoso pintor. Iniciou sua arte demonstrando a admiração por Volpi. Não sossegou. Evoluiu e deu origem a uma linguagem própria. Pequenas geometrias com as cores que usa para alegrar a cidade. Mas introduziu entre estas formas uns traços quase paralelos, que tampouco conformam-se com o alinhamento previsto e mostram-se incontroláveis escadas, assim como tem vontade própria a arte que sai das suas pinceladas. As escadas retornam à arte, o pintor de paredes, que com as mesmas mãos ilumina a cidade e colore os semblantes com um sorrir satisfeito.

Edson Camargo, artista plástico e pintor de paredes.

Camargo é um homem do povo, um homem das artes. Serviu uma lição a este presunçoso rascunhador de palavras.  Ensinou que a simplicidade pode originar o sublime. Demonstrou que no coração de cada pintor de paredes, um artista debate-se para transformar o invisível em visível. Obrigado, amigo Camargo, pelo ensinamento de humildade e inconformismo. Obrigado por iluminar pessoas e cidades.

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